segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

O PNEU

Nossa transição da infantilidade para adolescência foi pela General Osório, entre as ruas Bento Martins e Barão do Rio Branco, em Rosário do sul. Ali fora nosso espaço de vida, tendo como referência o Posto Texaco. Tínhamos uma turma de jogar bolita, futebol na rua que não era calçada, e nos reuníamos... Eu, Flávio Mayer, Chibo, Nando (Fernando Ribeiro), Cabana, Cândido, Gordo (irmão do Cândido), Beto, Roberto (filho do Seu João e da Dona Ilda do INPS), mais as gurias, a Suzana (irmã do Beto), a Vera (minha irmã) e a Eunice. Esses e mais o Dirceu, que como empregado da Marlene Zago, era o explorado do posto. Nessa época, nós tínhamos um medo mortal da Marlene. Quando alguém gritava “Aí vem a Marlene”, era um Deus-nos-acuda...

Atrás do posto tinha um reservatório de água, para lavagem de carros, e tomávamos banho dentro, o que a deixava furiosa. Numa feita, num fim de semana, o Sargento Cândido, pai do Cândido e do Gordo que moravam ao lado do reservatório (homem muito gordo), resolveu se refrescar no tanque junto conosco. Mas quando deu o alerta, ele não conseguiu sair a tempo e entalou. A Marlene descarregou um repertório de palavrões sem cabimento pra o homem(logo ela que era cheia dos pecados) que ele nunca mais quis praticar natação na nossa piscina!

Bueno, quase ninguém tinha televisão na época. Na frente do Flávio tinha uma, do Seu João que veio de Canoas e morava ali junto com a mulher e os filhos, numa casa bem antiga. Nós ficávamos a maioria na janela, pelo lado de fora, vendo os chuviscos. Conforme o nosso comportamento, ele não deixava nem espiar, como castigo. O que gostávamos de assistir era o “Ring 12 LiquiGás”. Nossos ídolos era o “Fantomas”, “Teddy Boy Marino”, e etc.

Numa noite, durante uma pelada na rua, pelas 21h, o Roberto nos chamou urgente ,pra ver pela janela uma brincadeira nos Estados Unidos, onde uma pessoa entrava no centro de uma câmara de borracha,onde ficava preso por uma rede. Largavam a pessoa numa pista protegida, onde ele descia em declive. Davam saltos e coisas do tipo, e nós achamos aquilo a coisa mais linda.

No outro dia, o Nando e o Chibo, que vinham após o almoço (depois da aula)pra brincar e tinham visto a novidade, contaram ter visto um pneu de trator, desmontado no Texaco, que era de propriedade do Seu Alcides Zago (marido da Marlen - informação colhida junto ao Dirceu).

Em diagonal ao Texaco morava o Seu Macedo (Vô da Rosângela e da Viviane) que tinha uma loja de calçados e criava galos de rinha no pátio, em gaiolas que eram suspensas do chão, todas em fila e tudo bem organizado, cercados por um muro.

Fomos ver o pneu e já o trouxemos junto pra frente da minha casa e da Vera, e que era o ponto mais alto da rua, com um declive duns 30 metros. Até a esquina deveria dar uns 120 metros...

Ficamos ali sentados no pneu e esperando que algum pato resolvesse fazer a viagem. Foi quando vimos o Beto e o Roberto saindo de casa para se juntar a nós, e fingimos discutir quem iria primeiro. O Roberto chegou e já se intrometeu: “A idéia foi minha, eu que chamei vocês. Eu tenho direito de ir primeiro...”.

Concordamos com ele imediatamente. Ele realmente tinha este direito...!!!!

O Beto dizia: “Não vai, não vai, que vai dar zebra. Tu vai te machucar e o pai vai te dar pau...”. Enquanto isso, a gente convencia o Roberto: “Capaz que tu vá te machucar, entra logo nesse pneu. Se tu não te anima, vou eu, capaz que alguém vá se machucar!”

O Roberto entrou, e fomos posicionando ele na descida. E antes que ele pudesse se arrepender, o empurramos ladeira abaixo... Mas nossos cálculos não funcionaram... Após uns 30 metros, e já com uma boa velocidade, o pneu bateu numa pedra, levantou mais ou menos 1 metro do chão e começou a pender pro lado esquerdo. Quando chegou no cruzamento, tinha um valo feito pela água. Foi aí que ele subiu mais uns 3 metros, aterrisou no meio da rua e subiu de novo, indo parar no muro do Seu Macedo,o derrubando... Entrou no meio das gaiolas dos galos e o que não derrubou, ele quebrou, espalhando todo o bicharedo e indo só parar no outro muro, depois de bater numa laranjeira.

A nossa debandada foi geral. O Beto, sentindo a tragédia, avisou a Zuleica, irmã mais velha e de poucos sorrisos, e foi correndo para o INPS pra chamar o pai e a mãe deles. O “pneunauta” Roberto, teve 2 costelas quebradas, luxações por todo corpo, um corte na testa, ficou rengo por uns 30 dias e quase terminou o ano infrequente no Colégio Marçal Pacheco.

O Seu João fez queixa pra todos os pais, nos cortaram a mesada e a junção na rua; também nos cortou o “Ring 12”, proibiu os guris de falarem conosco e nós ficamos uns 2 meses evitando de passar na frente da casa dele, quando não estava trabalhando. Os galos do Seu Macedo se espalharam de uma maneira que tiveram que esperar a noite para juntá-los, empuleirados em algumas árvores da vizinhança.

O Seu Macedo tinha problemas de audição, e não entendeu direito como o desastre tinha acontecido. Colorado doente, costumava ouvir os jogos do Inter através dos nossos sinais. Pessoa sensacional, continuou nosso amigo. Hoje mora nas nossas lembranças e mentes, e principalmente, no coração.

2 comentários:

  1. Ai, que saudades !
    Posto Texaco... sim, era nossa referência de endereço, sempre ! Nós, que morávamos em frente, nem se fala ! Loko, sensacional a tua história. Vou mandar o Nando ler. Tenho certeza que vai amar. E ter belas lembranças daqueles tempos idos, e ainda assim, nunca esquecidos.
    um grande abraço.

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  2. Não gosto muito de olhar para o passado, mas resolvi espiar teu blog,"cantado em verso e prosa"pelos meus irmãos.Fiquei encantada com a tua memória dos fatos e sem dúvida foi uma época muito especial de nossas vidas!Lembrei que quando nos conhecemos eu era uma menina descendo a ladeira numa bicicleta ,fazendo corrida com os meus irmãos!Espero que este teu lado de "menino travesso" nunca mude e a tua filha também deve ser um encanto ,pois escreveu transmitindo o sentimento de um momento tão distante.Um abração.

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