quinta-feira, 3 de setembro de 2009

MUNDO COLORIDO


O Baixinho Melado, ou Kita,ou José Aristes, trabalhava num determinado banco em Porto Alegre, mais precisamente de caixa. Eu na gerência de suprimentos da Kasper.

Como caixa, eles não prestavam conta todos os dias, somente no final do mês. Durante este período eles usavam pequenos valores do caixa pra diversas bobagens, e quando recebiam, recolocavam os valores gastos, prestando contas.

Uma manhã próxima ao dia 25, ao chegarem na agência , receberam a notícia que haveria auditoria em todos os caixas, durante o expediente, o que causou alvoroço geral, principalmente no Melado, que é o que mais usufruía desta prática.

Após tentar vários meios para conseguir o valor necessário, desistiu, e todos estavam no mesmo barco. Os auditores se aproximando, o nervosismo batendo. Quase meio dia e se lembrou do Valenzuela (sim, eu!), fechou o caixa para almoçar, e correu pra Kasper, entrando sala adentro sem ser anunciado (não dava tempo), todo desalinhado, e esbaforido dizia:
-“Tu tem que me salvar, tu tem que me salvar, só resta tu...”

Me contou história e os valores necessários, e explicou que após o almoço, um dos primeiros caixas a serem auditados seria o dele. Para aumentar o desespero do Melado, eu logo disse que não tinha como conseguir este dinheiro.

Ele sentado ,suando, as pernas abertas, a cabeça quase nos tornozelos, gemendo. Busquei um café bem forte para o acalmar, e enquanto ele se distraia com aquele artifício, fui até o financeiro da empresa, peguei o valor necessário, assinei o vale para o meu departamento, e voltei para azucrinar o Melado, dizia: “O brabo não são algemas, é o jornal, a foto, os comentários... tipo caixa da desfalque, pastel, suco, torradinhas, guloseimas, cerveja, janta no Chimarrão, sapato novo... é brabo”.
Coloquei o dinheiro na frente dele, mas ele não enxergou.

Chegou o meio dia: “Bueno Baixinho, já que não deu de um lado, vamos almoçar.”
-“Eu não tenho fome, tu não ta entendendo” –dizia ele-, “todos me abandonaram...”

Drama total... Nisto ele levanta a cabeça, enxerga o dindin, arregala os olhos, pega e sai correndo em direção ao banco,chegando bem antes da auditoria.

Me agradeceu eternamente, disse que no pagamento,dia cinco, me ressarciria.
Contudo, no mesmo dia, já tomamos umas cervejas por conta do caixa, mas não passou disto. E nunca chegou o dia do pagamento.

Dai uns tempos se demitiu do banco, e foi morar em Capão da Canoa , corretor de imóveis.

Lá chegando, conseguiu um sócio capitalista, meio descontado, e montaram um bar num prédio desse cara. O bar realmente era de muito bom gosto, vários ambientes, todos decorados, o piso de veludo vermelho, com espelhos, quadros, ornamentos. Tudo nota dez, incluindo os serviços e os preços. Deram ao local o nome de MUNDO COLORIDO.

O negócio ia de vento em popa. Eu já tinha ressarcido o valor ao financeiro da Kasper, e o Melado nunca mais falou do assunto. Chegaram as minhas férias, fevereiro, fui para Capão, ficando numa pousada por 15 dias. Na primeira semana fui com a família duas noites ao Mundo, gastei, paguei, dei gorjeta, tudo em ordem (e o Melado nada).

No final da outra semana, terminariam as minhas férias, então comecei a convidar pessoas que conhecia do lado profissional, para jantarem comigo no Mundo Colorido no meu aniversário sabado(que na verdade é em novembro), e já avisando que a conta era comigo, para dar quórum. Consegui uns 20 convidados, reservei o espaço, e no sábado, lá pelas 21h30 começaram a chegar os convivas. A festa ia legal,Uns caras muito chochos, naturalmente eu sugeri a todos como prato principal, camarão gigante, grelhado na manteiga, com guarnição (maravilhoso), por acaso o prato mais caro do cardápio.

Lá pela 1:30 o pessoal começou a ir embora, me alcançavam a comanda, me abraçavam(ja tinham dado o presente) e se retiravam. A mesa foi se esvaziando, ficando só uns mais próximos, 6 gatos pingados ,incluindo a família. O Melado viu que ninguém acertava a conta, e sentiu o cutuque. Chamou uma das garçonetes, pedindo para me perguntar,que como ele tinha que fechar o caixa, se eu ia pagar com cheque ou cartão. Respondi: “VOU ASSINAR A NOTA”.
Quando recebeu a noticia, só ouvi: “É A MINHA RUINA”

Se tem uma coisa bem real, o que o Melado tem de sobra é CLASSE, e não se abala por mixaria.

Após o tremor inicial, se dirigiu pra mesa, nem olhei pro semblante dele, esperando o estouro, pegou uma cadeira,pediu licença, sentou ao meu lado, olhou para a garçonete, e pediu 4 chopps, sem falar nada bebeu todos, de gut-gut, me olhou dizendo: “Só não vou pedir camarão porque vocês comeram tudo, DESGRAÇADO”

Sem muita conversa as contas ficaram certas e bebemos até clarear o dia.
Daí uns tempos terminou o Mundo Colorido pegando fogo. Não houve culpados. Mas o SEGURO era grande.

O Melado continua morando no meu coração.


*Foto: O Melado mesmo!

Um comentário:

  1. hehehe, essa eu adorei!! Estávamos falando sobre o Blog hoje aqui em Capão,eu, Flávio e o senhor Kita!!!!!!!!

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