terça-feira, 22 de setembro de 2009

O EXORCISTA

Nós fomos ao lançamento do filme “O exorcista” em Santa Maria, eu, Lacerda e Japonês (Cléber). O filme, pra época, realmente impressionava. Saímos do cinema agitados, eu e o Lacerda, o Japonês em estágio latente de impressionismo e lividez. O medo tomou conta do “home”.

Já na descida da Av. Rio Branco pra casa, ele se colocou no nosso meio, foi quando pudemos "tirar a febre” do Japa. Eu e o Lacerda nos entendíamos por música, e ao atravessarmos a Silva Jardim, na esquina do Hotel Glória, o Lacerda só me olhou e demos um pulo, correndo até o cordão da calçada. Não deu outra! O Japa ficou estaqueado,foi dobrando as pernas gemendo...: “Aaai...”, sem sair do mesmo lugar.

Seguiu o resto do trajeto num pavor que chegava a dar pena. Chegamos em casa, fomos pra o nosso quarto (eu e o Lacerda dividíamos o quarto), comentamos do filme com o João, o Botinha e o Bafo, e o Japonês já colocou uma cadeira na nossa cabeceira, entre os dois, pra acompanhar os relatos.

Já era uma hora da madruga, o Japa, que dividia o quarto com o Bafo (Tio Mille), não queria ir deitar no lugar dele. Ninguém o convenceu a sair, ele ficou lá sentado e com a luz acesa até o outro dia na hora do cursinho.

Aquela lenga-lenga já durava 4 dias. O Japa sentado toda noite com medo, dormindo nas aulas... Mais parecia um zumbi. Chamamos ele, comandados pelo Tio Mille (ao qual o respeito era grande) e o convencemos a voltar pro seu quarto, explicando que era tudo coisa de filme, arranjos, montagens, etc.

O resultado não foi muito bom. Mas ele chegou a dar uma dormida no catre dele (catre mesmo, ele comprou uma cama e no 2º dia deu uma luta entre todos, eu, João, Ney, Bafo, Lacerda, Botinha, e que casualmente acabou em cima da cama nova, que não agüentou... Muito fraca, segundo o Botinha). Já estava se animando, estudando até tarde, mas ,mais desconfiado do que égua torta ( cega de um olho).

Resolvemos então testar se o Japa já tinha assimilado o lance. Nosso apê era um antigo hotel, por isso tinha porta pra todos os lados, frente e com ligação pra entre os quartos, mais as janelas com venezianas. A divisão era a seguinte: eram 4 quartos, no da frente o João e o Ney, que ás vezes davam uma viajada, colocavam umas luzes coloridas, desmanchavam as camas e etc. No 2º, o Bafo e o Japa. No 3º o Botinha,e o Estevam da Tudinha Amaral (que dava um pau nele!) e no último, eu e o Lacerda, próximos do banheiro e da cozinha, separados por um corredor. Do lado de trás, as janelas e o acesso ao terraço.
Compramos um rolo de linha de nylon bem fininha e, como à tarde, o Japa ia estudar com o colegas e ficava até perto de 22h por lá, nós preparamos o local com calma. Atamos aquela linha em um vaso com canetas que ficava sobre a mesa de estudos com outras coisas, e também no pelego do chão, travesseiros, uma cadeira, um livro e alguns objetos. Colocamos os fios bem disfarçados, acompanhando os rodapés, e esperamos.

O Japa chegou. Educado com sempre, cumprimentou a todos que estavam na cozinha conversando bobagem. O Bafo perguntou: “E aí, sobrinho?! Tá aprendendo ou ta só sujando roupa em Santa Maria?”

“Tou indo!”, disse ele, “vou dar uma estudada numas coisas que não peguei bem antes de dormir”. Depois disso, ele se acomodou no seu quarto. Foi o que pedimos a Deus. Ficamos a postos, cada um numa abertura espiando.

Silêncio total. Eu tinha ficado com o pelego e o vaso. O Bafo com a cadeira. O João e o Lacerda com os demais utensílios. O Japa, cabeça baixa,bem concentrado... Foi quando dei uma pequena mexida no vaso... Ele parou e ficou sem fazer um único movimento, mas com os olhos grudados no vaso. Dei uma movimentada no pelego, ele correu só os olhos... Torceu tanto que quase tocou com eles na orelha, e dizia: “Ai, meu Deus... Ai, meu Deus...”.

Os demais também moveram discretamente os outros objetos. O Japa deu um suspiro fundo, repetindo: “Ai, meu Deus... Ai, meu Deus..o que esta acontecendo.”, fazendo menção de levantar.

Sem termos combinado nada, o restante soou com uma orquestra! Com o movimento do Japa, todos puxaram os objetos ao mesmo tempo. Bah... Ele deu um pulo, berrando! Passou por dentro da porta fechada, desceu as escadas e só foi parar no centro da avenida, debaixo de uma luz!

Levamos algum tempo pra nos recuperarmos! Fomos falar com ele pra saber por que ele havia sido intempestivamente de dentro do apartamento!

Como ele não sabia o que tinha acontecido, a coisa ficou sem nexo! Falava em diabo, exorcista, padre... E algo do tipo: “Eu nunca mais vou lá... Isso tá tudo possuído!”.

Foi difícil. E ele não voltou mesmo. Foi posar com uns colegas, e no outro dia, sem subir, pediu pra o Tio Mille levar até ele os livros do cursinho.

Não conseguimos o convencer, e ele acabou se mudando.

O diabo não passava do cagaço, de sua imaginação fértil, além de uma linha de pescar...!

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