domingo, 6 de setembro de 2009

O LOUCO DO ALVORINO NA PENSÃO VITÓRIA


A pensão Vitória tem três pavimentos, frente, escadas, pisos e algumas paredes de alvenaria com várias divisões de madeira na vertical, onde morava um monte de gente empilhada em beliches. Como era barata, nem esquentávamos a cabeça.

Nos serviam pão velho, carne estragada (aferventada com vermelhão e alho para pegar cor e disfarçar o cheiro) e daí por diante. Sempre parecia que ia ter mondongo! Nós morávamos no último andar, o 4º, quase um apart-hotel, pois tinha banheiro. Éramos eu, o Flávio e o Caranta.

Um dia apareceu um novo inquilino, conhecido nosso de Rosário, que chamavam de “Louco do Alvorino”, apelido dado a ele pois morava com o Sr. Alvorino do INPS, pai do Horácio e do Aldo (algum tempo depois o Horácio veio morar conosco, mas é outra história). O nome dele eu nem me lembro.

O que não tinha perdão na pensão, era atrasar o pagamento do aluguel. Após quatro meses, o Louco atrasou! Foi chamado na direção, quando pediram que regularizasse a conta e que procurasse outro lugar para morar. O Louco se virou, pagou e quando chegou a tarde, a cama dele já estava ocupada (no 2º andar) e suas roupas estavam enroladas ao lado da porta. Mas ele não tinha para onde ir, e nem se preparou com tanta urgência. Bateu nele um certo pavor.

Falou com o Flávio, que de pronto se manifestou:
- Posa aqui em cima conosco que ninguém fica sabendo, e amanhã, antes do café, tu te manda sem que ninguém te veja. Aí tu te vira.

Resolvido o problema, organizamos o pardieiro, mas não nos conformamos com a atitude desleal do véio (foi padre) que mandou ele embora. Chegou o Caranta, que era o mais velho, 47 anos, decidiu:
- Vamos nos despedir do Louco! Vou pagar um Velho Barreiro pra nós. Flávio, tu busca.

Realização total! Junto, veio um litrão de Pepsi (que era mais barata que a Coca) e outro Velho Barreiro, Lá pelo meio do primeiro Velho Barreiro, a imaginação começou a ficar fértil e concluímos: para retribuir o desaforo feito ao Louco, ele teria que cagar na porta do quarto do dono da pensão antes de sair de lá. Maravilha!! Plano aceito por nós por unanimidade e sem contestação. Mas o Louco ponderou, com razão. Isso poderia demorar, o velho acordar e encontrar ele, ou ainda, podia passar alguém, pois para todos os efeitos ele já tinha ido embora.

Resolvemos então que os três iriam fazer as necessidades, dentro de um saco de “Cristalçúcar”, e que o Louco, ao descer, levaria o saco e esfregaria na porta.

Com a nossa conversa alta e já no 2º Barreiro, o pessoal do 2º pavimento subiu pra saber o que estava acontecendo. Relatamos o plano. A adesão foi geral. Questão de meia hora o saco tava quase cheio, mais que o necessário para a empreitada.

Lá pelas 5h nós ainda estávamos acordados, e o Flávio resolveu descer com as bagagens do Louco para esperar por ele na Praça D. Feliciano, em frente à Santa Casa, para que o Louco tivesse as mãos livres para realizar a obra.

O Louco pegou o saco e saiu. Até hoje não sei como ele fez. Presumimos que ele desceu de costas e foi reboleando aquele saco até a porta da entrada. O último lance da escada da entrada tinha 5m. Eu nunca tinha visto um estrago tão grande: era no teto, nos lustres, nas portas, e principalmente, na porta do veio. Por tudo!

Lá pelas 6h30m fomos “acordados” pela BM que tinha sido chamada pelo dono da pensão para investigar quem tinha feito tamanho estrago.

Como o acontecido tinha começado no 2º andar, a Brigada logo nos descartou, permitindo que fôssemos trabalhar e ficando fora da “CPI da Bosta.”

Já fazia três dias do acontecido quando chegaram à conclusão que deveria ter sido alguém de fora que pudesse ter feito uma cópia da chave, ou alguns marginais poderiam ter adentrado a pensão. Resolveram trocar até as fechaduras da entrada.

O fedor era tão insuportável que ninguém aceitou fazer as refeições na pensão. O velho teve que pagar durante quatro dias um buffet na Rua da Praia aos pensionistas (barato).

Lavaram as paredes e portas com pinho-sol, Q-boa, e mesmo assim levou uns dez dias para que as coisas voltassem mais ou menos ao normal.

O dono da pensão deve ter entendido mais ou menos o recado pois a coisa melhorou em tudo um pouco: ATÉ NO PREÇO!

Nunca mais vi, nem ouvi falar do loco, mas que valeu a pena... Valeu.

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